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segunda-feira, 11 de julho de 2011

Cilada: Fui à Passeata

(Essa história eu escrevi em 2006, logo depois de estourar o escândalo do mensalão. O fogo da fervura estava quente na época, depois esfriou. Até hoje não entendo porque as denúncias contra Collor e PC Farias, que eram fichinha perto do que fizeram o PT e Marcos Valério, geraram os caras pintadas e o Impeachment, enquanto o mensalão até hoje não deu em nada.)

Nos meus tempos de estudante, nunca participei de atos públicos nem saí em passeata. Não fui do Diretório, pois achava que ser do Diretório era incompatível com estudar Medicina e que todos do Diretório eram comunistas, maconheiros ou pouco chegados ao estudo, que preferiam dedicar-se às ciências do ping-pong e do totó. Ou tudo isso ao mesmo tempo.

Há pouco tempo, recebi por e-mail um convite para participar de um ato público e passeata de repúdio à corrupção e à impunidade. Já trazia meu protesto solitário no vidro traseiro do carro há alguns meses, e, embora pouco à vontade, senti que não seria coerente se não participasse. Lá fomos nós, eu e minha mulher, domingo à tarde, para a grande manifestação que deveria acontecer na Cinelândia. Parei o carro à distância de alguns quarteirões e seguimos a pé, vestindo preto, como pedia a convocação. De longe avistamos o carro de som, e, em volta, uma multidão de cerca de doze pessoas. Deu vontade de voltar, mas já estávamos ali, fomos ver de perto como as coisas iriam ou não iriam se desenrolar.

Aos poucos percebemos mais pessoas de preto a distâncias variáveis, certamente esperando para decidir se se aproximavam ou não. Cerca de trinta policiais observavam de longe, tranqüilos de que não teriam muito o que fazer. O líder do movimento, um homem de cerca de quarenta anos, cara de pequeno empresário pintada de verde e amarelo, se apresentou e deu as boas vindas. Apresentou alguns dos outros gatos pingados, todos protestadores profissionais, pedindo pela punição dos assassinos de uma adolescente, pelo banimento da raça pitbull e outras causas mais ou menos nobres. Depois ele mandou o carro de som mandar ver. Atacaram com "Eu te amo meu Brasil, eu te amo, meu coração é verde, amarelo, branco azul anil" (que roubada!)

 "Meu amigo, essa não", protestei, "isso é hino da ditadura, essa aí não pode não!"

Não é possível que não soubessem. Mas meu protesto deu certo, não tocaram mais essa.

Um grupo estendeu uma bela faixa com a bandeira do Império, pedindo o fim da República e a restauração da Monarquia. Outros estenderam no chão um rolo de plástico de dois metros de largura por muitos de comprimento, estampado com muitas bandeiras do Brasil (era época de Copa do Mundo). Uma velha senhora trouxe um balde, que enchera de água no Amarelinho, algumas vassouras e uma caixa de sabão em pó. Alguns começaram a enxaguar o Brasil, para alegria da Imprensa, que a essa altura já se fazia presente e disparou as suas câmeras.  Algumas pessoas de preto deixaram as escadas do Municipal e as mesas do Amarelinho e se animaram a participar. Distribuíram adesivos com a palavra "Basta", narizes de palhaço e apitos, que começamos soprar furiosamente.

Apareceram as musas Lúcia Veríssimo e Christiane Torloni, que subiram no carro de som e fizeram discursos. "Parece que colocaram ecstasy no Guandu, ninguém protesta!" Concordei e achei que colocaram também nas Águas de Niterói.

Uma mulher, que se apresentou como empresária em dificuldades, pegou o microfone e disse saber de fonte segura que estava prestes a ser votado no Congresso um Projeto de Lei que estabelecia o confisco de qualquer ganho mensal individual superior a R$ 4.000,00. Alguns crédulos do Apocalipse Now arregalaram o olho. Vão pedir a volta dos Militares, pensei. Roubada!

Agitou-se uma enorme bandeira do Brasil e, depois, aquela pequena e heterogênea multidão, já cerca de quinhentas pessoas, saiu em passeata. A Lúcia Veríssimo acompanhou a pé até o fim, a Christiane eu não vi mais. Contornamos o Passeio e a Praça Paris, congraçando neo-monarquistas, neo-totalitaristas, P-Solistas, pequenos empresários endividados, jovens estudantes de coração puro e revoltados de primeira viagem (nós dois). Até que foi bonito. Viva a liberdade de expressão, esse valor tão caro!

Fomos para casa e ficamos assistindo o Fantástico para ver a repercussão, afinal a Globo também estava lá. Cid Moreira registrou o fato em cerca de sete segundos, uma frase. A Christiane Torloni apareceu em off no alto do carro de som.

Não me arrependo de nada!

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