Aqui compartilho contos, crônicas, poesia, fotos e artes em geral. Escrevo o que penso, e quero saber o que você pensa também. Comentários são benvindos! (comente como ANÔNIMO e assine no fim do comentário). No "follow by E mail" você pode se cadastrar para ser avisado sempre que pintar novidade no blog.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Visite minhas fotos no Flickr

Ubatuba, seis da manhã.
Aqui na coluna à direita => você pode acessar esta e algumas outras fotos minhas selecionadas no link "Flickr: Ralph Antunes' photostream". Tem, entre outras, uma seleção fotos de pássaros livres na natureza. Dê uma conferida!

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Passarinho japonês

Minha primeira tentativa com máscara líquida. Inspirado em gravuras japonesas.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Uma graça


Ela trabalhava quando se conheceram. Depois de casados, convenceu-a a deixar o emprego para que pudesse se dedicar mais às crianças. Quando as crianças cresceram, ela quis retomar os estudos e candidatar-se a uma bolsa de mestrado. “Bobagem, para que você precisa de mestrado? O que eu ganho é mais que suficiente para nós.” Quando ela emitia um comentário em uma festa de família, ele sempre desqualificava sua opinião. Achava bobagem ela gastar dinheiro em salão de beleza, pintar os cabelos em casa era tão mais barato. Além do mais, roupas da moda e bijuterias eram coisas de mulheres inseguras, ele a amava do jeitinho simples que ela sempre fora.

Quando, depois de dezessete anos de casamento, ele saiu de casa, recomendou ao jardineiro que não deixasse de regá-la a cada dois dias. E que, a cada primavera, a desenvasasse e podasse suas raízes. Hoje ela tem cinquenta e dois anos de idade e trinta e sete centímetros de altura. Uma graça de mulher-bonsai. 

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Dedo de Deus

Dedo de Deus, Parque Nacional da Serra dos Órgãos, RJ. Fiquei bem feliz com o resultado. Sinal que as aulas com mestre Alarcão estão produzindo frutos. Ajudou muito o pincel de pelo de esquilo, que eu estava estreando. Ele absorve muita tinta ao mesmo tempo que tem a ponta muito fina e delicada. Bom investimento.

domingo, 22 de janeiro de 2012

Eu, eu mesmo e Antunes

Existem férias com casa cheia, na praia ou na serra. Fila no posto e no mercado, cerveja, churrasco com a galera e música alta. Existem também férias com viagem, aeroporto, faz e desfaz mala, muita andança, cada dia um roteiro a cumprir, cada dia um restaurante, uma paisagem, muitas atrações imperdíveis.

Eu, todo ano, me dou uns poucos dias de férias de tudo e de todos, menos de mim mesmo, alguns dias por ano sozinho aqui nessa roça, aqui nessa serra.  Fico bem só com minha própria companhia. A família? Só chega sexta feira. Tédio? Nem de longe.  Cuidado de não fazer planos demais e terminar sentindo que não se fez tudo que se queria fazer. Dias cheios, portanto. Agora à tarde estava tateando “Por una cabeza” no teclado quando ouvi uma piadeira do lado de fora. Senha para pegar correndo os binóculos e a Canon com tele. Lá por cima do sítio da Ana Maria, um bando de tucanos. De que espécie? Alguns clics revelam: bico preto e papo amarelo, Ramphastus vitelinus segundo me diz o “Aves Brasileiras”, do Dalgas Frisch. Com essa, já são 75 espécies diferentes de pássaros avistadas por aqui. Ganhei o dia.

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Ontem saí para uma caminhada. Vou até o mirante de Bananeiras, decido já no caminho. Se na estradinha de terra da vila já passa pouca gente, na estrada do mirante anda-se horas sem cruzar viva alma. Até há pouco tempo, motoristas com tração nas quatro e espírito de aventura podiam subir a serra desde Silva Jardim pela trilha de terra até aqui, mas a ponte de madeira, já do lado de cá da vertente, caiu de podre há uns quatro anos. Agora só se passa a pé, a cavalo ou de moto. Fico observando o vau do riacho por baixo do que restou da ponte: se tirar aquele tronco caído que está represando a água, se jogar umas pedras grandes no ponto mais fundo, se usar um pouco a enxada aqui e ali daria para passar com o jipe pela água, fico arquitetando. Sigo em frente. Mais adiante, um vulto cinza vai caminhando uns vinte metros na minha dianteira. Vou andando, ele vai andando. Acelero, ele acelera e tenta subir o barranco para o mato. Acelero mais e ele, gordo, escorrega de volta para a estrada. Dou uma corrida e ele sai voando magnífico para o lado contrário. Um macuco! Tinamus solitarius, como eu. Só tinha visto antes no pacote de manteiga, fora do qual ele andou perigando de extinção. Mas dizem que estão voltando a se multiplicar com a redução da caça. Acredito. Outro dia ganho. Espécie 76.

Logo depois, a vista magnífica da baixada de Silva Jardim, a lagoa ao fundo e o mar lá no horizonte. Vento úmido, trovoadas distantes, arapongas nem tanto, terrén, terrén, terrén. Acho que não vai chover tão cedo. Arrisco então descer a Serra do Mar para fazer reconhecimento da trilha. Aqui, dá para rolar essa pedra grande para fora do caminho, ali tem que cortar aquele tronco caído. Trazendo machado, enxada, alavanca de ferro e mais uns dois pares de braços, vai dar para passar de jipe, se vai!

Continuo descendo. Bananeiras e mais bananeiras, casal de passarinho preto e branco, perninhas vermelhas, nunca vi antes. A mata se abre em capoeiras e passo por duas porteiras. “Favor colocá a correnti”, num rabisco quase apagado, então obedeço. Nenhuma marca de pneu no chão, só casco de boi e ferradura. Nenhuma marca de sapato também. Passo pelo primeiro ranchinho: deserto. Já estou a meio caminho da baixada e ainda não vi ninguém. Melhor dar meia volta e subir antes que escureça. Vamos pernas, coragem, me levem para casa. Pausa para um gole d’água no regatinho de água fresca que vem cascateando esperto lá de cima e cruza a trilha. E sobe, e sobe, vamos pernas, um, dois, me levem para casa. A passagem para o lado de lá da serra aparece como um decote na mata da vertente. Chegando no alto, um suspiro e outra olhada demorada para a paisagem e para o silêncio.  Chego em casa no lusco-fusco. Bom trabalho, pernas, amanhã dou folga para vocês.

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Hoje fiz geléia de framboesa do mato. Botar um pouco menos de açúcar da próxima vez, mas ficou gostosa. Assisti o documentário The Blues, do Win Wenders, que Samara e Augustus me deram no aniversário. Nele descobri os pioneiros J. B. Lenoir, Skip James e Blind Willie Johnson. Não podia morrer sem antes saber quem foram eles. Agora à noite, enquanto escrevo, estou ouvindo meu I Pod ligado no som da sala, na altura que eu quero, direito que todo homem deveria ter pelo menos durante alguns dias no ano. Mutantes e Black Sabath, Tom Jobim e Sarah Vaughn, Credence Clearwater, Secos & Molhados, Adoniran e Django Reinhardt, tudo junto e misturado, muito bom.

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O toque sinistro foi que no meio da primeira noite acordei nem sei por quê e tinha uma coisa preta se mexendo em cima do meu peito. Morcego! #$%@&! Pulei da cama e fui buscar o tapete do banheiro para apanhar o bicho e jogar pela janela. Quando voltei o bastardinho tinha sumido. Revira coberta, levanta colchão, olha atrás do armário, dentro do sapato e nada. Vou até o espelho do banheiro e examino o pescoço, sabe lá? Depois vou dormir em outro quarto com a porta fechada.

No dia seguinte tomo providências que vinha adiando fazia tempo. Compro madeira, prego e um esquadro de marceneiro no armazém do Leir. Com ajuda do Batista, vedamos toda e cada fresta entre os caibros e as telhas do telhado em toda volta da casa. Sinto muito, morceguinhos, mas vocês ultrapassaram a fronteira da tolerância.

Via das dúvidas, prestem atenção quando eu passar na frente do espelho. E se eu parar de envelhecer ou um séquito de meninas adolescentes começar a andar atrás de mim, melhor munirem-se de gola alta, crucifixo e água benta quando estiverem comigo. Por enquanto, não estou dormindo de cabeça para baixo.

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E uma última notícia antes de encerrar esta edição: acabo de ver passar um gambá pela varanda. Tadinho, agora vai ter que dormir ao relento.

Alto da Serra do Mar


sábado, 14 de janeiro de 2012

É nós no Face!


(Pois é, já estamos íntimos assim, eu e o Facebook, nos tratando por apelidos.)

Em meados de 2010 um amigo que mora no exterior me avisou por e-mail, (essa ferramenta hoje quase extinta fora do ambiente corporativo) que tinha postado umas fotos no FB. Eu tinha conseguido passar incólume pelo falecido Orkut. Aquela coisa orkutiana de depoimento, dizem, acabou com muito relacionamento. Achei prudente manter distância. Mas eu queria ver as fotos do meu amigo, então fiz minha página naquele que, então, já era o maior site de relacionamentos do mundo, mas que ainda era novidade por aqui. O Orkut, que só emplacou no Brasil, reinava então absoluto nessas terras tupiniquins.

Agora estou tentando olhar essa febre com o distanciamento necessário para uma visão crítica. Tá bom, eu admito; hoje não passo um dia sem checar minha página inicial. Mas isso tem me gerado um certo incômodo. Fui bastante liberal em adicionar amigos com a segunda intenção de divulgar esse blog, admito.

Sem dúvida, o Face tem o lado bom. Localizei antigos amigos de quem não tinha notícias havia anos, muitos com os quais eu cruzaria na rua sem reconhecer. Cabelos de menos, barriga de mais nos homens; senhoras louras nos seus cinqüenta, algumas delas vovós orgulhosas. Mas tem sempre um registro meio desbotado dos velhos e bons tempos no álbum de fotos para tirar qualquer dúvida. Aliás, como as pessoas estão sempre bonitas na foto do perfil, não? Também acontece de descobrir afinidades insuspeitas com pessoas com as quais eu tinha ou tenho mínimo contato no mundo real, a ponto de fazer surgir algumas boas amizades. Tem também compartilhamentos de vídeos interessantíssimos, garimpados por pessoas de bom gosto.

Mas tem o lado sinistro. Primeira constatação: tem muita gente desocupada nesse mundo de Deus. Gente que posta sem parar e, venhamos e convenhamos, não existe tanta coisa interessante assim para ser compartilhada. Uma enxurrada de abobrinhas para as quais eu não tenho paciência. Tem quem alardeie o óbvio, tipo, “hoje é segunda feira, que chato”, ou “fim de semana com chuva, ninguém merece”. Tem quem poste diariamente uma foto nova do pimpolho bonitinho que nasceu há três meses. Convenhamos também, depois de três meses nem nosso primeiro filho continua sendo novidade, quanto mais filho dos outros. Têm aqueles que, na falta de uma opinião original, compartilham aqueles quadradinhos de filosofia barata como se fosse uma revelação divina. Têm os rancorosos, os ressentidos, os sarcásticos e os felizes demais. Têm os que sempre disparam o comentário inteligente mais comum nessas páginas: o onipresente kkkkkkkkkkk... Desses, ainda prefiro os sarcásticos: em geral são mais inteligentes que a média. Por algumas das razões acima, às vezes com incidência em diversos artigos desse código penal, já excluí diversos da minha lista de amigos. Por falar nisso, alguém realmente acredita que tenha duzentos ou quinhentos amigos?

Parece-me que algumas coisas estão na base do sucesso do FB e de todos os sites de relacionamento. O mais óbvio é a necessidade de interação com o outro. Uma interação meio asséptica, onde acreditamos estar filtrando muito do que realmente somos para só mostrar o lado legal, divertido, interessante e descolado. Doce ilusão. As pessoas acabam revelando muito mais de si do que imaginam, mesmo quando pensam estar sendo comedidas. Isso para não falar dos que, virtualmente, põem a bunda na janela. Fotos sem camisa, de biquíni, com copos de bebida na mão, fotos da intimidade da família toda, da patroa, do maridão, dos filhos, de amigos e de lugares que freqüentam escancarados para um mundo de gente desconhecida ou semidesconhecida, nem sempre bem intencionada. Nem todos tomam os cuidados recomendados pelos especialistas, de só permitir acesso a certas informações aos “amigos”. Mas se são quinhentos “amigos”, de que valem esses cuidados? A prudência quase sempre cede diante de outra característica marcante no FB: o narcisismo puro e simples, a busca inconsciente da fama. “Que legal! Cinqüenta e dois curtiram o que eu postei e vinte e cinco compartilharam aquela abobrinha de segunda mão. Eu sou popular, afinal!”

Mas pode ser que enquanto nós estamos aqui interagindo virtualmente, sua esposa ou marido tenha ido dormir sozinho ou seu filho tenha desistido de esperar você largar o computador para dividir aquela angústia que tanto o está incomodando. Ele deve estar agora fechado em seu quarto compartilhando o assunto com os “amigos” do Face.

É isso. Se curtiu, compartilhe, viu? Kkkkkkkkkkkkkk...

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Araucárias no Planalto

Parece o planalto gaúcho, perto de Cambará do Sul

domingo, 1 de janeiro de 2012

Além do Country Club


Pois é. Aqui em Rio Bonito de Cima tem dessas ambivalências. A primeira vez que viemos, antes de comprarmos o sítio, ficamos hospedados na Cabritinha Vadia, improvável pub irlandês com meia dúzia de quartos por cima, encravado aqui nessa roça esquecida pelo diabo. Na época, ainda era do Ulf, o sueco, e da Regina, Deus a tenha. Depois do jantar,  um prato delicado e delicioso - frango ao molho de limão, filé ao molho de pimenta verde, goulasch ou outra delícia - sempre aparecia gente interessante para conversar e bebericar. “Tem três populações aqui”, ensinava o Ulf, “os passantes, os hóspedes e o country club, donos de sítios.” Na época, éramos da segunda categoria, e há nove anos somos da terceira.

Pois então, depois do jantar, lareira acesa, no aconchego de sofás de molas e de gravuras botânicas e do folclore sueco penduradas no madeirame rústico das colunas, o country club se revelou simpático e sofisticado. Parecia-me que eram todos habituées da Europa, muitos com períodos de residência no velho mundo. Eu, para não fazer feio, me esforçando na minha cultura geral de segunda mão para participar da conversa. Veja bem, não me pareceu que ninguém fosse esnobe, era cada um falando de suas experiências, não tinha cabimento omitir suas Londres, Paris e Vienas do assunto se eram essas suas vivências, enquanto as minhas praticamente se resumiam a Niterói e uma ida longínqua a Nova York. Se disserem que também estive em Assunção do Paraguai eu nego. Ano passado fomos pela primeira vez à Europa, França e Inglaterra, e na ocasião não me eximi de pensar: “Na próxima vou poder falar como chic e não ficar atrás”, vê se pode?

Só não me falaram que tem também a quarta categoria, a mais numerosa: são os da terra, nascidos e criados, os minhocas de Rio Bonito de Cima. Um Guerra e Paz completo de personagens, dramas e histórias, todos interligados por laços de parentesco. Só o Batista, nosso caseiro, tem mais dez irmãos, fora sobrinhos, tios, cunhados, primos e compadres, que abrangem quase toda a população do lugar, umas trezentas almas em busca da salvação, reunidas em torno da simpática igrejinha católica. Tem o Niltinho, que toca a venda na curva do rio, a Ângela, cozinheira e dona do restaurante de comidinha caseira nota dez. A Madalena, que tem o comércio misto de bar, venda e point da juventude local, que chega às noites de sábado a pé, de moto ou a cavalo para jogar sinuca, ouvir música sertaneja, ver e ser visto pelos solteiros do sexo oposto. Tem o Justino, motorista do caminhão da Prefeitura, o Dr. Armandinho, que resolveu a pendência de inventário de nosso sítio, o Leir, o Manezinho Bora, o Biscoitinho, o João Bobinho, a Magalona, o Zequinha, o Hercílio... Nosso sítio fica nas franjas do arraial e, ao contrário da maioria dos outros sitiantes, vamos a pé almoçar na Ângela e fazer compras no Niltinho ou na Madalena, o que nos proporciona muitos bons-dias e boas-tardes, um dedo de prosa aqui, outro acolá. Fora as consultas médicas em troca de muito-obrigado, dúzia de ovo caipira ou queijinho caseiro. Acaba que temos muito mais contato com esse Rio Bonito de Cima que com o outro. Já fomos até convidados para casamento da filha da Magalona com o filho do Justino, quanta honra, fora as comemorações de Nossa Senhora de Nazaré na igrejinha. Dois Rios Bonitos de Cima que pouco se misturam, bem Brasil.