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sábado, 29 de setembro de 2012

Diários de Viagem: 1 - Pincel de Barba


Ia viajar. Achei que era hora de ter mais um pincel de barba, para deixar na bolsa de viagem e não correr o risco de me esquecer dele, como já aconteceu. O único que tinha  então era o segundo de minha vida. Pincéis de barba, quando bons, duram muito. O primeiro, me deu meu avô, assim que surgiram-me os primeiros pelos na cara (lembrei-me agora das vezes em que, nos últimos de seus 96 anos, barbeei meu avô). Era da marca Batil, que não sei se existe ainda, e fez-me pensar que todos os pincéis de barba eram assim macios. Depois de muito uso, já ralo em pelos, pediu descanso e substituição. Custei a encontrar outro da mesma qualidade, que uso até hoje.

Então, parti para a missão. Aproveito, pensei, e compro também um bom pente para meu enteado, que iniciou um estágio de Administração em uma multinacional e passou, pasmem, a sentir necessidade de ajeitar o cabelo no meio do dia. Entrei numa farmácia. Pincel de barba? Ali. Sessão de variedades: bobs de cabelo, pentes plásticos de tamanhos variados, buchas de banho, pinças, tesouras e alicates de unha pendurados em um display, embalados individualmente. Só havia um tipo de pincel, made in China, com cabo de madeira e pelos brancos. Abri a embalagem e testei-o contra o rosto. Devem ter usado como matéria prima pelos de porco espinho ou bigode de javali. Perguntei à mocinha se havia pentes de osso. Ela me olhou como se eu tivesse pedido equipamento para sangria, sanguessugas vivas talvez. Fui a uma segunda farmácia, uma terceira, umas sete ou oito. O pincel chinês dominou completamente o mercado (cadê o Cade que não vê isso?) e pentes de osso não existem mais.

Senti-me como um viajante do tempo em seu próprio tempo. Lembro-me, eu pequeno, de  assistir meu pai barbeando-se e engraxando os sapatos, sempre pretos, diariamente antes de sair para o trabalho. Men stuff, era assim que todo homem fazia e eu faria também quando me tornasse um homem. Tenho hoje uma caixa com graxa marrom, preta e incolor, três escovas pequenas para espalhar cada tipo de graxa e três escovas grandes e macias para dar brilho, além de uma flanela para o capricho. Engraxo meus próprios sapatos e, talvez por isso, eles duram muito. Faço a barba diariamente, fins de semana e férias inclusive, espalhando o creme de barbear com pincel e raspando com lâmina descartável. Depois, gel facial ou loção pós barba. Tenho dois pentes de osso, um em casa e outro na pasta de couro que levo para o trabalho. Ambos têm, cada um, mais de dez anos de uso: são indestrutíveis. Fiquei a me sentir um solitário, como alguém que ainda usa máquina de datilografar em tempos de computadores. Fiz uma pesquisa informal e rápida, nesses tempos de homens de barba eternamente de três dias, que é a que mais coça. Prevalecem a espuma em spray espalhada com os dedos ou o aparelho elétrico.

Na Itália existem pincéis de barba bonitos e elegantes, de pelos variados, cada um mais macio que o outro. Existem pentes de osso também. São vendidos em farmácias (que são muito diferentes desses supermercados da saúde e da beleza feminina daqui), ou em lojas que vendem também relógios, prendedores de gravata, charutos e cachimbos. Men stuff. São caros, mas valem o preço. Trouxe um pincel que o vendedor disse ser de pelos de texugo. Outro pincel, pelo andar da carruagem, só aos 75, 80 anos de idade, se precisar.

6 comentários:

  1. Muito boa! No tempo dos descartáveis, difícil guardar as coisas assim, né... Bjs, continue a publicar crônicas europeias!

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  2. Ótima ,como de costume.Se bem que cê tá ficando tão chique que não sei não...

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  3. OI RALPH, SOU EU MARIZA, quanto tempo não nos falamos, ainda não sei se vc. vai receber direito om que estou escrevendo. Continua a mesma errada de sempre!
    Gostei muito do que vc falou sôbre os pentes de oço e pincel de barba.
    Lembrei muuito de seu avô, de seu pai e enfim do meu pai também!!!!Pois quando faleceu, encontrei montes de pente de oço!!!!!!! Pensei, papai era exagerado, prá que comprar tantos pentes?Agora entendo sua preocupação em ter tantos pentes. HÀ muito não tenho lido nem visto suas pinturas, devem estar lindas, pois desde o início, vi que tinhas um jeito danado!Agora então , deves estar um artista!!!!! bjks. MARIZA.

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  4. Hoje em dia pincéis de qualidade só em tabacarias, lojas especializadas e sites de e-commerce específicos que vamos encontrar "Men Stuff" tão tradicionais e nas redes de drogarias modernas somente lixo chinês. Em tempos de descartáveis estes são produtos que não contemplam a lógica capitalista da ciclo de consumo rápido e da margem de lucro com rotação de estoque, portanto se tornaram produtos vips e chiques com preços "premiuns" para compensar a produção em pequena escala. Mas, ainda há público que valoriza este tipo de produto, eu sou um desses também. Confesso que há poucos anos atrás passei pela mesma experiência de não encontrar pincéis de barbear e fui descobrindo onde encontrá-los em pouco tempo. De qualquer maneira recomendo não usar lâminas descartáveis, o Gillete G3 é bem melhor e não "assassina" o barbear, na minha opinião. O cabo do G3 dura eternamente e as lâminas de refil duram bastante, portanto compensa em muito o preço superior pois oferecem maior durabilidade e qualidade do barbear. No mais é espuma de barbear e de vez em quando um pós barba para arrematar o serviço bem feito. Há... já ia esquecendo, a dica de fazer a barba depois de molhar o rosto com água quente é 10! Bom barbear!

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    1. Ricardo, onde vc achou pincel de barba para comprar?

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  5. Obviamente, "men stuff" não é a minha praia!

    Mas, também sinto na pele o avanço das quinquilharias baratas que dominam o mercado e, assim, detonam os artigos (masculinos e femininos) de qualidade que, obviamente, não conseguem com elas concorrer. Ótima observação! E ótimo texto, pra variar!

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