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domingo, 7 de julho de 2013

Quatro personagens em busca de um enredo

Larissa Werneck, 20 anos.

Estudante do segundo ano de História da UFF. Usa óculos, tem nariz grande e seios fartos. Nas raras vezes em que solta os cabelos e tira os óculos, fica até bonita. É filha de Denizar Werneck, dono de uma agência de automóveis na Rua Dr. Celestino, e Maria de Lourdes Frazão Werneck, proprietária do salão de beleza “Malu Coiffeur”, no Jardim Icaraí. Larissa não frequenta o salão da mãe, não usa maquiagem e nem sempre usa sutiã. É vice-presidente do Diretório da UFF, onde seus discursos inflamados empolgam até a turma mais interessada no baseado e na cerveja. Liderou seu grupo em todas as doze manifestações e lamenta não ser homem para ajudar na depredação dos símbolos do capitalismo burguês. Já tentou de diversas formas, mas ainda não conseguiu ser agredida pela PM. Comprou “O Capital” de Marx há dois anos, mas não teve tempo de ler. Nutre admiração intensa por seu professor de História do Brasil I, Flamínio Fraga Neto. Tinha intenção de terminar a noite com ele depois do último churrasco do Diretório. Quase conseguiu, mas ele bebeu demais e dormiu na hora H. Acha que não vai passar de ano. Não tem tido tempo de ler ou estudar ultimamente. Quer ser parte da História, e não apenas assisti-la.

Matheus da Silva Costa, 19 anos.

Filho único de Cléa da Silva, secretária de uma escola particular, e de José Carlos Costa, taxista, que Matheus não vê desde quando cursava a pré-escola. Muito estudioso, aproveitou bem a bolsa de estudos a que sua mãe fazia jus e passou para Direito na UFF. Não leva jeito para futebol e não torce por nenhum time. Secretamente apaixonado por Larissa, de quem é colega desde o primeiro grau, nunca se declarou por conta de sua timidez. Zeloso, pretende ser bem sucedido na carreira para poder retribuir tudo o que sua mãe sempre fez por ele. Tentando impressionar Larissa, já leu duas vezes “O Capital”. Pela mesma razão, também leu Hegel, Maiakovski e as biografias de Lenin e Bakunin. Atualmente está lendo a poesia completa de Paulo Leminski. Foi a quase todas as manifestações. Só faltou a duas, porque coincidiam com os dias de prova. Quando vai, está sempre na linha de frente, com um olho na PM e outro em Larissa. Nas horas mais inconvenientes, em meio ao estrondo das bombas de efeito moral, às vezes ouve seu celular tocar: é sua mãe, preocupada. “Está tudo bem, mãe”, responde tossindo com o gás lacrimogêneo. Na última chamada, distraiu-se e levou uma bala de borracha na testa. Exibe a marca como um troféu. Postou a foto no facebook no mesmo dia, esperando pelo menos uma curtida de Larissa, o que não aconteceu.

Flamínio Fraga Neto, 43 anos.

Professor assistente de História, separado de Lucimar Loyola, com quem teve um filho. Não sabe bem se bebe demais por causa da separação ou se Lucimar o deixou porque ele bebia demais. Vem empurrando o mestrado com a barriga há quatro anos. Tinha intenção de ser escritor. Conseguiu dois terceiros e um segundo lugar em oito anos de participações em concursos literários. Teve contos publicados em duas coletâneas. Nunca escreveu um romance. Atualmente coordena o concurso literário anual da universidade. Nas coletâneas do concurso, publica um currículo seu nas duas últimas páginas, onde aparece em foto sem camisa e declara-se um caçador de estrelas. Na verdade, é um caçador de alunas do segundo ano.

Denizar Werneck, 52 anos.


Pai de Larissa e marido de Malu. Filho de corretor de imóveis e professora primária. Abandonou os estudos no fim do segundo grau, quando o pai morreu de infarto. Ralou como contínuo, assistente administrativo e vendedor de carros usados. Extrovertido e bem falante, descobriu-se um ótimo vendedor. Trabalhou como autônomo, juntou dinheiro e hoje é sócio da maior revenda de usados de Niterói. Mora numa mansão em condomínio fechado na região oceânica. Usa cordão e pulseira de ouro, que somados, pesam mais de cem gramas. Orgulha-se de sua trajetória. Assim que pôde, levou a família à Disney. Adora Miami, onde passa férias e faz compras. Sonha secretamente em mudar-se para lá. Alardeia nunca ter votado no PT, mas na verdade votou sim, na primeira candidatura contra Fernando Collor. Não consegue entender Larissa, aquela menininha que está abraçada com o Mickey na foto sobre sua mesa no escritório. Acha que as posições dela têm alguma coisa de pessoal, e a falta de gratidão da filha o deixa magoado. Odeia Chávez, Lula, Dilma, Fidel e Evo Morales. Mas seu maior pesadelo são os fiscais da receita, os abutres que ele tem que alimentar com propina. Também, “se fosse arcar com toda essa absurda carga tributária do país, já teria falido há muito tempo”.

3 comentários:

  1. O enredo está pronto. Os personagens, devidamente estruturados. Agora só falta o cronista sentar e fazer o conto, a novela, o romance. Então nós, os leitores, poderemos testemunhar o quanto da criação se vale da realidade, ou será o oposto? Na dúvida, literatura na veia, Ralph, para o todo e sempre.
    Abço,
    Adriana Riva

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  2. Ansiosa, aguardo pra saber o que acontecerá na vida destas personagens, Ralph!

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